Indicação que eu roubei da Natália, e
um livro que eu devorei compulsivamente, porque o assunto me interessa (os efeitos da internet na nossa vida),
mas fiquei puta com o formato. São micro contos (de terror, eu diria).
Alguns a gente consegue acompanhar por mais tempo, outros só duram duas
ou três páginas. E eu queria uma história inteira, pelo amor de deus.
Mas - spoiler - todas elas terminam mal pro narrador.
Esse
livro me fez pensar em três coisas: A privacidade, a solidão e as
relações em tempos de internet. Um cara chantageia meninas. Uma mulher
se permite ser cruel com um robô. Um menino gasta tudo que tem pra fugir
da vida real e se afundar na virtual (olha lá o metaverso!!!). Outro cara tentando ganhar
dinheiro se vê descobrindo um esquema de violação de direitos. Todas
essas pessoas se conectam com estranhos por meio de um Furby que faz
videotransmissão: tem gente que paga pra ser o Furby, tem gente que paga
pra ter o Furby, e a conexão entre os dois é insubstituível até acabar a
bateria do bicho. Ou um dos dois desistir.
Ao mesmo tempo que o
filósofo já disse que o inferno são os outros, o outro poeta lá disse
que é melhor se sofrer junto do que ser feliz sozinho, e assim o ser
humano atravessa a existência nesse dilema de se relacionar tentando
controlar ao máximo o que pode do processo. Nesse livro, ele cria esse Furby que não fala, não
late, não enguiça e volta sozinho pra base. Mas pra algumas pessoas não
é suficiente ficar assistindo um bicho com carinha de animal circular
pelo chão, elas querem conversar, e tentam burlar esse sistema de mão
única pra dar voz pro Furby (o kentuki). Tem gente que não quer
conversar, quer usar essa conexão pra tirar algum proveito do outro. Ou
talvez até mesmo conversar seja tirar algum proveito do outro, já que a
relação boneco - ser humano é extremamente virtual e, sem essa
possibilidade de reação direta, parece que as pessoas se relacionam mais
com as projeções e fantasias na cabeça delas mesmas do que com a pessoa
em si.
Sei que tem gente que vai argumentar que altruísmo não
existe e a gente vai agir sempre motivado pelo nosso bem estar, mas essa
relação construída em cima desse mediador virtual em formato de
bichinho que não fala me parece um outro tipo de egoísmo, sei lá.
Mas
a parte que mais alugou um triplex na minha cabeça foi a sobre
privacidade. Imagino que Black Mirror já deve ter lançado algo do
gênero, mas me deu PAVOR a ideia de um ser humano desconhecido tendo
acesso à minha casa com uma câmera e acesso de circulação. Só que é meio
que o que a gente já faz sem saber, com nossos gadgets por aí. Faz
alguns anos que por força maior eu todo todo esse cuidado de não sair
postando informações muito pessoais na internet, justamente pq não sei
quem pode estar vendo, e aí esse livro vem pra confirmar toda a sorte de
desgraças que podem vir de estranhos que te vêem e você não sabe.
É um tempo muito estranho pra estar viva, sei lá (diz ela, escrevendo num blog pra sei lá quem nessa internet de meu deus).
Kentukis, da argentina Samanta Schweblin. De 2018, no Brasil publicado pela editora fósforo.
Em tempo: desde a minha outra encarcação bloguística eu garrei um ódio de fazer qualquer coisa que pareça uma resenha, porque ela sempre traz a sensação de que eu preciso produzir um texto Sério e com Validade, que vai reforçar minha imagem como pessoa culta que não apenas consome mas também discute obras interessantes. Isso não é uma resenha, se isso parece uma resenha é por mero acidente, isso aqui é somente a minha Opinião, 100% powered by vozes da minha cabeça.
Eu não ia conseguir ler esse livro sem ficar paranoica, guria. A privacidade é uma coisa extremamente delicada na Internet. Pra tu ter uma ideia, eu descobri o endereço de uma blogueira famosinha só de ver a vista da janela dela e de saber qual a construtora do prédio. Tem um seriado coreano na Netflix que eu não lembro o nome e nem tive coragem de continuar assistindo, mas que manda uma mensagem bem forte sobre privacidade (a guria manda o celular para arrumar e o cara acessa todo o telefone dela via remoto, deixando a câmera frontal sempre ligada).
ReplyDeleteNos primórdios da blogosfera a gente escrevia sobre a nossa vida sem tantos pudores assim. Hoje em dia é até perigoso.
MULHER, SIM!!!!! A gente compartilha tantos fragmentos de informação sem perceber as vezes que com ctz, se fosse o caso de ter um stalker, ele já tinha achado a casa de todo mundo. Felizmente eu não sou ninguém na internet, mas a gente nunca sabe, tem doido pra tudo.
DeleteE pensar que já teve gente que dava o número de celular no blog em uma outra blogosfera kkkkkkkk realmente a gente acompanhou isso aqui quando tudo era mato
Acho que você fez muito bem uma resenha não-resenha, porque você trouxe os pontos principais do livro, mas mais pra discutir o tema central do que as histórias por ali. O texto despretensioso venceu!!! hahahaha
ReplyDeleteEu cheguei num ponto da vida onde eu também fico entre ligar o foda-se (porque claramente meus dados estão sendo acessados, com ou sem esforço da minha parte) e juntar meus livros e me mudar pra algum lugar onde eu precise andar uns 15km pra ter sinal de telefone. Aliás, quanto mais trabalho com tecnologia, menos eu queria ter acesso à maior parte dela. Gosto de poder procurar as informações que eu quero, gosto de receber minhas comprinhas em casa, mas odeio o show que tudo virou e como a gente tem se acostumado a gritar tudo pro vazio. De certa forma, acho que voltei pro blog por essa razão: parece que é um espaço mais fechado, com menos eco do que outras redes sociais. De uma época que a gente ainda se esforçava pra enxergar a pessoa do outro lado da tela (o que é um pouco irônico, considerando que o discurso naquela época era que todo mundo que a gente não conhecia era o próximo maníaco do parque hahaha).
Enfim. Fiquei bem interessada em ler o livro :P
feliz com o resultado!!!!! eu não quero vender livro, eu não quero influenciar gente a ler o livro, eu só quero falar sobre o livro auhauahuaua (mas que bom que vc curtiu, eu nao sei se gostei, mas ele ficou martelando na minha cabeca entao cumpriu seu proposito)
ReplyDeletePiu, é isso demais. Nossos dados estão tudo por aí, só torço que a minha irrelevância continue me protegendo de ser chantageada por algum golpista. E sim, eu amo internet banking, comprar coisa da china, a wikipedia, mensageiros instantaneos, ouvir mp3, mas parece que pra ter isso a gente precisa ficar preso nesse circo performando uma identidade o tempo todo??? Aqui nesse blog eu tb me sinto mais livre desse panóptico virtual.
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